Informação em tempo de férias
As férias da grande maioria dos portugueses já chegaram ao fim, naturalmente que me refiro àqueles privilegiados que vão tendo emprego e como tal direito a férias. Neste período foi evidente a inversão dos fluxos de trânsito e de hábitos, as cidades ficaram menos congestionadas e as aldeias menos desertificadas.
Quer tenha sido num destino tropical, dentro do país ou simplesmente em casa de familiares, todos aproveitaram a paragem de férias para descomprimir do stress acumulado ao longo do ano nas actividades de cada um. Aproveita-se para rever familiares, para fazer tudo aquilo que ao longo do resto do ano não é possível fazer, por isso é natural que nos desliguemos da maioria das fontes de informação, que no seu conjunto é suposto garantirem alguma pluralidade. Jornais diários ou mesmo semanais, Internet ou mesmo a rádio ficam muitas vezes esquecidos ou até propositadamente deixados de lado. Mas a televisão é algo que é quase impossível dispensar, a não ser que se esteja longe do país.
Se, mesmo com acesso a todos os meios de comunicação social é difícil haver uma real pluralidade, vendo apenas televisão, é quase impossível o acesso a uma qualquer ideia de contraditório. Precisamente na forma como se faz a informação televisiva em Portugal, se vai moldando a consciência colectiva. A escolha das notícias de abertura, dos directos, dos destaques, tudo nos leva a formar uma maneira comum de pensar, na ausência de outros meios que nos façam reflectir sobre aquilo que nos entra pelos sentidos, trazido pela caixa que dizem ter mudado o mundo.
Não é difícil encontrar exemplos, a morte do futebolista espanhol Puerta mereceu ligações em directo de todos os canais, no Iraque morrem diariamente dezenas de pessoas e, no máximo, aparecem alguns segundos de notícia como descargo de consciência. Será a vida de um jogador é assim tão mais importante que as vidas de tantas pessoas inocentes? Não creio.
Todos os dias somos bombardeados em todos os jornais, de todos os canais, com largos minutos do diário dos treinos dos chamados clubes grandes de futebol e das declarações repetitivas e muitas vezes fastidiosas dos respectivos treinadores. Enquanto isso ficam esquecidos tantos problemas, tantas coisas boas conseguidas pelo país fora por tantas pessoas que todos os dias se esforçam pelo bem comum e que ficam no anonimato por força dos objectivos de audiências.
As ditas audiências não deveriam influenciar desta forma as escolhas e as opções dos responsáveis pelos serviços noticiosos. Naturalmente que cabe a cada um de nós filtrar a informação que nos chega e tentar ter informação com diferentes formas e de diferentes proveniências, sob pena estar a ser formatada uma consciência colectiva baseada em interesses pouco claros e que os portugueses estejam aos poucos a perder a capacidade de compreender, analisar e agir sobre o mundo que nos rodeia, sendo facilmente influenciáveis pelos poderes instituídos.
Crónica publicada no Jornal Opinião Pública de 05/09/2007